Catarina saiu pelas ruas com seu vestido florido, atravessando vendavais de esquina, tempestades de quarteirão, praças desertas e becos lotados. Marchou, furiosamente, por uma hora e quarenta e três minutos até se lembrar o motivo pelo qual havia saído. E percebeu, pela primeira vez, que não poderia mais voltar.
Então, caminhou por mais uma hora, até estar bastante distante, e concluiu que deveria abandonar a cidade. Diante dos muros baixos de uma casa cor de tijolo, decidiu que teria 15 dias para cruzar a fronteira. 'Um dia para me despedir de cada ano que vivi aqui'. Tratou de excluir os três primeiros anos, que sua memória não alcançava, e alguns outros que julgava terem sido desprezíveis.
Havia superado Almodóvar, Bertolucci ainda não, os beatniks, a vodka, as solas dos pés com cacos de vidro, a disposição aos acasos, as festas que podem desabar, os jornais, sobretudo os jornais e as revistas, os refrigerantes nojentos, eca!, os papos de drogado acomodado, os planos eternos (ou eternamente irrealizáveis), a histeria de 'não amar, não amar, não amar...' (Ó, que sofrimento!). No auge de uma corrida desatinada, percebeu que alguém deveria ter mexido naquela faixa amarela com a inscrição "Fim". Tentou pedir informação: Onde vai, onde vamos? Mas, acredite você, todos estavam se debatendo sozinhos como aquelas moléculas acaloradas das aulas de química. Que cena estranha. "Alguém está bagunçando com a gente, pessoal!", ela gritou. Não era para ser assim. "Desliga o maçarico, está todo mundo ficando doido".
Pelo menos, a epifania teve trilha sonora do Beethoven e luz celestial. Mentira. Foi assim: ela ficou puta da vida e leu na placa cinza Bem-vindo ao deserto do real.
E Catarina é uma radicalzinha. "Sou meeeesmo", ela repete sozinha ao ouvir a narrativa em off de sua própria vida. Disse para o diretor: "Corta tudo. Pode cortar tudo. Corta álcool, corta crise, corta esse bando de figurante, corta o espetáculo adolescente-burguês. Isso é palhaçada, ouviu?". Então, o diretor, um tipo introvertido e pacífico, cortou. Ainda se ouviu, vindo do fundo, um princípio de vaia. Mas o fundo nunca importa. Catarina representa só para a primeira fileira.
25 July 2008
17 July 2008
Passagem das horas
Trago dentro do meu coração,
Como num cofre
Que não se pode fechar de cheio,
Todos os lugares onde estive,
Todos os portos a que cheguei,
Todas as paisagens que vi
Através de janelas ou vigias,
Ou de tombadilhos, sonhando,
E tudo isso, que é tanto,
É pouco para o que eu quero.
(FP)
Como num cofre
Que não se pode fechar de cheio,
Todos os lugares onde estive,
Todos os portos a que cheguei,
Todas as paisagens que vi
Através de janelas ou vigias,
Ou de tombadilhos, sonhando,
E tudo isso, que é tanto,
É pouco para o que eu quero.
(FP)
06 July 2008
02 July 2008
O mistério das pombinhas
No outro dia, estava prestes a dormir quando uma revelação me tirou da cama. Eu havia decifrado o mistério das palomitas de maíz! Conheço a tradução há cerca de dez anos: pipocas. Mas só depois de tanto tempo entendi que os grãos de milho estourados assumem o aspecto de pombinhas. É um gênio quem inventou essa expressão. Nunca mais voltarei a comer pipocas sem lembrar que são, na verdade, pombinhas de milho.
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